Os Pioneiros: Júlio Cézar Ribeiro, Augusto Severo, Santos Dumont e Von Zeppelin

Se acho que Bartlomeu de Gusmão foi injustiçado pela história, que direi de Júlio Cézar e de Augusto Severo? Nem sequer são citados, salvo raríssimas exceções, quando se comenta o assunto. Pois bem, segue mais um pequeno texto, desta vez destacando mais personalidades da, por vezes injusta, história da aviação. O artigo cita ainda Santos Dumont e o Conde Von Zeppelin. Boa leitura.

O sucesso dos voos dos irmãos Montgolfier tornaram a aerostação popular na Europa do século XVIII. O balão foi rapidamente adotado pelos sportsman (desportistas, em uma época em que não havia o vernáculo na língua portuguesa) e também utilizados pelos militares como pontos de observação do deslocamento das tropas inimigas. Um dos fatos relevantes da utilização dos balões ocorreu quando Napoleão III, cercado pelos exércitos inimigos, durante a Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), ordenou que mais de 60 balões fossem lançados conduzindo informantes e soldados franceses, numa tentativa de vencer o cerco germânico.

Após sua popularização, o balão adquiriu o status de esporte, no mesmo patamar em que estavam as corridas de cavalo e, mais tarde no início do século XX, estariam as corridas de automóveis.

Durante um longo período a utilização dos balões foi sendo aperfeiçoada. O ar quente utilizado, proveniente de fogueiras embarcadas, foi substituído pelo gás hidrogênio, muito menos denso, cerca de 14 vezes menos, que o ar atmosférico, o que possibilitou o surgimento de aparelhos muito mais leves.

Apesar de todos avanços, uma questão ainda não resolvida dificultava a ampla utilização dos balões como meio de transporte eficaz. Os primeiros aeróstatos não eram manobráveis, ficavam à mercê das correntes de vento, não sendo possível direciona-los de acordo com a necessidade do utilizador. Começava a busca pela dirigibilidade. E neste assunto, alguns brasileiros se destacaram positivamente: Júlio Cézar Ribeiro de Souza, Augusto Severo e o mais vitorioso de todos, Alberto Santos Dumont.

Júlio Cézar Ribeiro de Souza
Nos idos de 1880, predominava na Europa a ideia de que os balões deveriam ser perfeitamente simétricos e alongados e seus apetrechos e equipamentos, como a barquinha, por exemplo, deveriam ser instalados no centro geométrico do aparelho, que também era o centro de gravidade. Este caminho erado foi alterado por novos conceitos trazidos à tona por Júlio Cézar Ribeiro de Souza. Júlio Cézar, nascido na Vila de Acará, no Pará em 13 de junho de 1843, dedica-se aos estudos na Navegação Aérea a partir de 1875, baseado nos movimentos de voo dos pássaros. Em 1880 lança o artigo “Memória sobre a Navegação Aérea” no qual elenca sua principal teoria.

Júlio Cézar aponta em seu trabalho que os balões para serem dirigíveis deveriam ter um formato fusiforme e perfil dissimétrico aerodinâmico, criando o conceito da moderna aerodinâmica. As afirmações surpreenderam os inventores da época que trabalhavam, sem obter sucesso, com o conceito de forma fusiforme e perfil simétrico.

Com incentivo do Governo do Pará, segue para Paris, associa-se ao Aeroclube, requer a patente de seu invento em 10 países e inicia a construção de seu primeiro balão, o Vitória – homenagem à esposa, encomendado a Casa Lachambre & Machuron, importante fabricante de balões da época, que serviria também a Santos Dumont.
Em 8 de novembro de 1881, Júlio Cézar realiza uma exitosa experiência de voo, na presença de várias testemunhas, na qual seu dirigível evoluiu em todas as direções, inclusive contra o vento, sem o auxílio de propulsores e sem qualquer esforço excessivo.

Apesar do êxito obtido com o Vitória, Júlio Cézar não conseguiu repetir o sucesso. As tentativas posteriores de demonstrar o balão em território brasileiro fracassaram e colocaram a imprensa do Rio de Janeiro, Capital do Império, contra o financiamento do projeto. O Rio de Janeiro já vivia os ares da República vindoura e o Imperador Pedro II, assim como todos seus partidários ou simpatizantes eram execrados sem piedade pelo escárnio da imprensa.

Mesmo com forças contrárias, o inventor consegue financiamento para construir um segundo balão, O Santa Maria de Belém, que é danificado pela explosão em uma usina de produção do gás hidrogênio. Houve ainda a construção de um terceiro balão, com o qual fez mais experimentos de sucesso em Paris, porém sem reverberação em terras brasileiras. Desta forma, perdeu apoio e prestígio entre os financiadores de outrora e faleceu pobre, sem recursos para o próprio sepultamento em 14 de outubro de 1887, deixando um legado valoroso para a aerostação. Seus conceitos foram plagiados e possibilitaram o surgimento de diversos inventos de sucesso.

Augusto Severo
Outro brasileiro que logrou êxitos na busca pela dirigibilidade do balão foi o potiguar Augusto Severo de Albuquerque Maranhão. Nascido em uma família de aristocratas e políticos do Rio Grande do Norte, ocupou cargos importantes no Congresso Nacional, onde conseguiu apoio do Presidente Floriano Peixoto para desenvolver balões para o uso militar, tendo como base um galpão do Ministério da Guerra no Campo de Tiro de Realengo. O primeiro balão foi construído pela Casa Lachambre e trazido de Paris para o Rio de Janeiro.

Este balão, de 1893 denominado Bartolomeu de Gusmão, foi o primeiro a ser construído com estrutura semirrígida, utilizando bambu, realizou testes no ano seguinte e comprovou ser extremamente eficaz no quesito da dirigibilidade, porém a escassez de recursos do Governo para o financiamento do empreendimento levou Augusto Severo a abandonar o projeto.

Em 1901, ecoam no Brasil as notícias do sucesso de Santos Dumont ao conquistar o prêmio Deutsch e Augusto Severo se vê motivado para perseguir seus projetos. Ainda em 1901, pede licença do Congresso Nacional e segue para Paris para construir seu balão Dirigível.

O PAX era um dirigível com 30 metros de comprimento, fusiforme de forma dissimétricas, conforme determinara Júlio Cézar, dois motores de 16 e 24 cavalos e um corpo semirrígido que demandava 2.000 metros cúbicos de hidrogênio. O aeróstato foi testado algumas vezes por seu inventor, quando no dia 12 de maio de 1902 em uma ascensão acompanhado de seu mecânico de confiança, Sachet, o calor dilata o Hidrogênio, que força uma das paredes do invólucro projetando-o sobre o motor, quando então uma faísca causa a explosão do balão vitimando os dois ocupantes. Este acidente encerra o trabalho de mais um pioneiro da aerostação e abala profundamente um de seus melhores amigos, Alberto Santos Dumont.

Como certamente Santos Dumont merece um artigo exclusivo, vamos deixá-lo para depois e falar ainda sobre uma importante figura da história da aerostação, Von Zeppelin.

Conde Von Zeppelin
No contexto da aerostação, um capítulo de muito sucesso foi o surgimento de grandes dirigíveis rígidos, capazes de transportar passageiros e cargas em massa. Estes dirigíveis são em grande parte obra de Ferdinand Adolf August Heinrich von Zeppelin, nascido a 08 de julho de 1837, em Constance na Alemanha.

Após abandonar o posto de oficial de cavalaria do exército alemão, Von Zeppelin passou a se dedicar às máquinas voadoras, notadamente os dirigíveis de estrutura rígida. Em 1900 realizou o voo de seu primeiro dirigível, o LZ-1. Após alguns fracassos, mas com persistência incomum, em 1907, consegue apoio e funda a Luftschiffbau Zeppelin, com o objetivo de construir uma frota de dirigíveis. Durante a operação da empresa foram produzidas mais de 100 aeronaves.

Os zepelins foram usados para o transporte de passageiros e cargas e, durante a 1ª Guerra Mundial como eficientes bombardeiros. Ao final da guerra, o uso dos zepelins foi intensificado, realizando os primeiros voos transatlânticos comerciais. A carreira dos grandes balões dirigíveis rígidos desenvolveu-se largamente, até que em 1937, o maior dirigível construído, o Hindenburg explodiu em Lakehurst, nos Estados Unidos no final de uma viagem transatlântica, ponto fim ao uso das máquinas.

Em uma época em que os aviões ainda não tinham a capacidade de atravessar os oceanos, a navegação transatlântica era feita pelos Zepelins. Os dirigíveis ligavam a Alemanha aos EUA e ao Brasil. Estas fantásticas aeronaves operaram no Brasil entre 1930 e 1937. Na cidade do Rio de Janeiro-RJ, encontra-se um dos poucos hangares destinados aos Zepelins no mundo, localizado na Base Aérea de Santa Cruz, e no Recife-PE, provavelmente a única torre de atracação de Zepelins das Américas, situada no Bairro do Jiquiá. Von Zeppelin foi tão importante que seu nome passou a designar os dirigíveis.

A invenção do avião, deve, e muito, aos experimentos de dirigibilidade realizados com o balões. O próprio Santos Dumont transfere muito do que havia criado para o mais pesado que ar, mas como já citei, Alberto Santos Dumont certamente merece um artigo a parte. Vejo você nas aerovias.