Órgãos do Governo Federal e a Aviação Civil: quem faz o quê? “depende do assunto”.

Caros leitores, não é raro que eu tenha que responder aos amigos e alunos, questionamentos sobre quem é a autoridade aeronáutica brasileira. Normalmente, minha resposta é acompanhada por um “depende do assunto”. O que normalmente causa mais confusão ao meu interlocutor. Estes questionamentos têm origem em uma certa confusão que existe na aparente sobreposição de órgãos da administração pública federal que tratam do assunto aviação.

Para alguns assuntos o responsável é a ANAC, para outros o Comando da Aeronáutica, entretanto, órgãos como CINDACTA, DECEA, CENIPA, DCTA, INFAERO e um sem número de letrinhas e siglas, cada qual com sua função, mas todas ligadas à aviação, surgem quando o assunto sobre autoridade aeronáutica é trazido á baila. Assim, trago um trecho do meu livro sobre “Bases da Regulamentação de Tráfego Aéreo” que tenta explicar quem é quem, nesta relativa confusão de siglas, órgãos e tarefas. Boa Leitura.

Bom, como você já sabe, o objetivo aqui é elucidar as funções de cada um desses atores na regulação da aviação civil nacional, em termos de regulação e fiscalização; regulação econômica; regulação técnica; regulação ambiental; regulação contra atos ilícitos; infraestrutura aeroportuária; navegação aérea e controle do tráfego aéreo; investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos; planejamento; educação, tecnologia e pesquisa; e relações internacionais, a saber:

Regulação econômica: Consiste em regulamentação, coordenação, monitoramento e fiscalização econômica das entidades do setor; coordenação de eventuais processos de concessão, autorização, privatização e participação público-privadas; e a promoção dos interesses do consumidor. Cabe

à Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) a regulação econômica da aviação civil, assim como o estabelecimento de tarifas de operação dos aeroportos. As tarifas decorrentes do uso dos serviços de tráfego aéreo e navegação aérea cabem ao Comando da Aeronáutica.

Regulação técnica: Homologação e certificação dos produtos e processos aeronáuticos; homologação, registro e cadastramento de aeródromos; regulamentação e fiscalização das atividades de serviços aéreos e a sua outorga; regulamentação, fiscalização e autorização dos serviços aéreos prestados por aeroclubes, escolas e cursos de aviação civil; regulamentação e fiscalização das atividades relativas à segurança operacional da infraestrutura aeroportuária, incluindo: definição de projetos, construção e operação de aeroportos; movimentação de passageiros, carga e demais serviços auxiliares; licenças de pessoal; medicina aeronáutica. Cabe à ANAC.

Regulação ambiental: Regulamentação e fiscalização de emissões de poluentes e ruído aeronáutico; infraestrutura aeronáutica e aeroportuária, visando garantir sua compatibilidade com a proteção ambiental e com o uso ordenado do solo. As questões relacionadas à aviação, quando dizem respeito aos impactos e licenças ambientais para implantação de infraestrutura aeroportuária são reguladas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA). Porém, a implantação de medidas é de responsabilidade do administrador do aeroporto em questão. Cabe à ANAC a regulação para o controle da emissão de ruídos no setor aéreo.

Regulação contra atos ilícitos: Estabelecimento de requisitos técnicos, padrões e normas para os aspectos relacionados à segurança contra atos ilícitos; aceitação/ aprovação dos programas de segurança (Aviation Security – AvSec) dos aeroportos, companhias aéreas, operadores de carga, provedores de serviços auxiliares. O Programa Nacional de Segurança da Aviação Civil, elaborado pela ANAC para toda a aviação civil brasileira, estabelece as seguintes responsabilidades no setor: cabe à Polícia Federal a responsabilidade pela segurança contra atos ilícitos nos aeroportos; cabe à Empresa brasileira de infraestrutura Aeroportuária (Infraero) verificar os passageiros antes de entrarem nas salas de embarque; em regiões não assistidas pela Polícia Federal, cabe às forças policiais locais (estadual ou municipal) executar ações de proteção da segurança da aviação civil.

Infraestrutura aeroportuária: Execução de investimentos em aeroportos e respectiva administração e operação. O detentor dos ativos de infraestrutura dos principais aeroportos do país é o Governo Federal, cabendo a exploração destes ser realizada pela Infraero, governos estaduais, governos municipais ou por empresas concessionárias. A regulação e supervisão dos aeroportos permanecem, porém, com a ANAC.

Navegação aérea e controle de tráfego aéreo: Refere-se ao controle do tráfego aéreo, preparo e distribuição de informações sobre voos, fornecimento de recursos para comunicação, navegação e monitoramento, e provisão de serviços meteorológicos para o setor. Essas ações são centralizadas e reguladas pelo COMAER, através do DECEA, inclusive todos os atuais 84 Grupamentos de Navegação Aérea (GNA) pertencem à estrutura da Infraero, mas operam em conformidade com as normas e sob coordenação do DECEA.

Investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos: Trata da atuação do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SIPAER) no âmbito da aviação civil. Atividades realizadas pelo COMAER, por meio do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA).

Planejamento da aviação civil: Desenvolvimento de previsões para o setor, definição de investimento em aeroportos e coordenação da integração com outros modais de transporte. No Brasil, o planejamento da aviação civil não é uma atividade regulamentada, cabendo a cada ente apresentar e cumprir seu planejamento para o seu setor de atuação: a Infraero planeja os investimentos em infraestrutura aeroportuária de sua administração; a ANAC é responsável pelo Plano Aeroviário Nacional (PAN), e pela destinação de recursos verba do Programa Federal de Auxílios a Aeroportos (PROFAA), visando atender as demandas dos estados e municípios.

Educação, tecnologia e pesquisa: Realização de pesquisas técnicas e científicas sobre temas do setor de aviação civil e capacitação de recursos humanos para o setor. Cabe ao COMAER coordenar as pesquisas do setor de aviação civil. As dotações orçamentárias destinadas ao desenvolvimento, às pesquisas e aos estudos para a aviação civil são também de responsabilidade do COMAER. A formação de controladores de voo é realizada na Escola Especialista de Aeronáutica (EEAR) e no Instituto de Controle do Espaço Aéreo (ICEA), ambos na estrutura do COMAER. Os cursos de formação de pilotos, comissários de voo, mecânicos de manutenção aeronáutica e demais profissionais para o sistema de aviação civil brasileiro são de prerrogativa da ANAC e concedidos a empresas privadas, organizadas como escolas de aviação ou aeroclubes, sob autorização e fiscalização exercidas pela ANAC.

Relações internacionais: Refere-se à representação do país nos órgãos internacionais de aviação civil em diversos temas do setor, incluindo discussão e celebração de acordos internacionais. A ANAC é a representante do Brasil perante a Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO) e os acordos internacionais são feitos pela ANAC em parceria com o Ministério de Relações Exteriores.

Planejamento da aviação civil: A ANAC, como autoridade aeronáutica brasileira tem as funções de regulação, planejamento, execução e fiscalização do setor aéreo nacional.

Bom, agora acho que minha resposta acompanhada do “depende do assunto” passa a fazer sentido para você também. Um país continental e complexo como o nosso nem sempre pode lançar mão de soluções simples para seus problemas de gestão. Este é o preço pela imponência e importância que temos no cenário internacional da aviação.

Mas para que não fiquem dúvidas, temos basicamente duas autoridades aeronáuticas dominantes: o DECEA, quanto o assunto está relacionado ao Sistema de Controle do espaço Aéreo Brasileiro e suas atividades (Controle, Navegação, meteorologia, Comunicações e etc.) e a ANAC, quando o assunto é Regulação. Entretanto, fique atento, como nós vimos, a resposta é um tanto quanto complexa. Vejo você nas aerovias.